Gesto inusitado
O dia estava nublado. Várias pessoas aguardavam o
ônibus na estação tubo, resguardando-se do vento frio, que soprava forte.
Os olhares de todos se revezavam entre o relógio de
pulso e a rua à esquerda, de onde deveria vir a condução.
De repente, a porta central se abriu e os olhares
ali se concentraram, não entendendo o porquê, desde que nenhum ônibus estava à
vista.
Então, viram que o cobrador saiu de seu posto,
saltou para a rua e se dirigiu alguns metros adiante, à direita.
Um rapaz aguardava na calçada. O cobrador lhe
ofereceu o braço e juntos atravessaram a rua. O rapaz era cego.
Os passageiros que aguardavam o ônibus se
entreolharam, admirados. O gesto fora inusitado, considerando-se ainda que
ninguém se apercebera da dificuldade do deficiente visual.
Contudo, o cobrador estava atento e, deixando seu
posto, foi prestar solidariedade ao seu irmão, deixando-o, tranquilo, do outro
lado da rua.
Houve cumprimentos de alguns para ele. Houve quem
fosse além e lhe desejasse bênçãos celestes.
Ele corou e disse: Nada fiz demais. Eu vi
que ele estava inseguro para atravessar e resolvi ajudar.
Refletindo com Edu!
O cobrador era um jovem. Para aqueles que costumam
dizer que o mundo está perdido, que ninguém se importa com ninguém; que a
juventude vive alheia ao seu entorno, o gesto inusitado prova o contrário.
Poder-se-á dizer, quem sabe, que é um em um milhão.
Pelo contrário, para quem tem olhos de ver, esses exemplos se multiplicam às
dezenas.
O que ocorre é que, normalmente, da mesma forma que
os passageiros, temos os olhos postos somente em uma direção, não nos
permitindo alargar a visão, buscando outras paisagens.
O bem está no mundo e se apresenta, diariamente, em
gestos anônimos e desinteressados como o da pessoa que vê cair a carteira da bolsa
de alguém, a apanha e corre até alcançá-la, a fim de a devolver.
Ou de quem percebe que o cadeirante está com
dificuldades para subir à calçada e se oferece para auxiliar;
Da vizinha que se predispõe a cuidar das crianças,
enquanto os pais necessitam atender a uma emergência; da atendente hospitalar
que, extrapolando seu horário de trabalho, fica com o paciente até que chegue
seu familiar, para que ele não se sinta só ou entre em pânico; da mãe que leva
pela mão seu filho a saborear um sorvete e, observando que outra criança o fixa
com olhos de desejo, a essa oferece idêntica gostosura; de alguém que encontra
um cão pela rua e, percebendo ser bem cuidado, cogita que deva pertencer a quem
muito o quer e se esmera em descobrir seu dono. Pensa que possa ser de uma
pessoa solitária, cuja companhia única lhe seja o animal.
Ou, quem sabe, de uma criança que lhe chora a
ausência, intranquila e medrosa.
Sim, há muito bem no mundo. Há quem divida o
próprio coração para amar os filhos da carne alheia.
E adicione água ao feijão a fim de servir um prato
a mais a quem tem fome. E subtraia pequenos desejos pessoais, a fim de atender
a verdadeiras necessidades de terceiros, tudo numa bendita e especial
matemática.
Uma especial matemática cujo resultado é amor,
harmonia, bem-querer, um mundo melhor.
¹ Fundador e Autor do Blog: Eduardo Campos, Técnico em Gestão Pública: Pedagogo, Esp. em
Docência do Ensino Superior – PROEJA e
Educação em Saúde. Pesquisador do
Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação do Campo na Amazônia-GEPERUAZ/UFPA
² Fonte texto : R M E - Em 17.02.2012.
³ Fonte imagem : http://www.intercambio7.com.br/sims-e-naos-para-seu-intercambio.jpg
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